A audiência pública para discutir o armamento da Guarda Municipal contou com as presenças de diversas autoridades ligadas à segurança pública e convidados nesta quinta-feira (16), na Câmara Municipal. A iniciativa foi do vereador Edcarlo dos Santos - Kaká Se Liga (PSL), após a sanção do "Estatuto Geral das Guardas Municipais", no dia 11 de agosto pela presidente Dilma Rousseff (PT). A proposta prevê o uso de armas de fogo aos profissionais dando-lhes ainda o poder de Polícia. Com isso, a GM também poderá atuar no patrulhamento preventivo, em ações de prevenção à violência e em conjunto com as Polícias Civil e Militar.
O assunto, debatido já há algum tempo na cidade, tem sido defendido pelo vereador. "Temos uma GM atuante, efetiva, enfim pessoas que honram seu uniforme. Não podemos admitir que a nossa guarda vá para as ruas sem possuir uma ferramenta de defesa, desarmada e desprotegida. O objetivo dessa audiência, além de debater o assunto, é elaborar um documento oficial endereçado ao Executivo solicitando o cumprimento da lei federal", concluiu.
Antes de abrir espaço para o debate, Kaká mostrou um vídeo com o intuito de auxiliar as pessoas presentes sobre o assunto. Logo após, o vereador esclareceu que para armar nossa guarda é necessário um convênio com a Polícia Federal, no qual deve-se cumprir determinações desta polícia, entre elas teste psicológico de 2 em 2 anos, curso de tiro com duração de 80 horas/ano, além de documentos dos guardas. "Precisamos qualificar nossa GM, pois ninguém nasce com qualificações. Não podemos agir mais com irresponsabilidade, mandando para as ruas guardas sem uma arma na cintura para enfrentar bandido". Kaká ressaltou durante a reunião, ser muito importante ouvir a população. "O povo está sofrendo com tanta criminalidade e ouvi-lo dá respaldo à proposta", acrescentando que o município tem outro problema grave que é o déficit do efetivo da Polícia Militar. "Nosso objetivo também é, com o armamento, minimizar os reflexos desse déficit. Além do armamento, o parlamentar quer trabalhar para o aumento do efetivo e por uma remuneração melhor para a Guarda Municipal de Uberaba". Ele também defende um novo plano de carreira para a categoria, um quartel adequado, com frota de veículos, infraestrutura e, o mais importante, treinamento.
Representando o prefeito Paulo Piau, o secretário de Trânsito e Transportes Emmanuel Kappel [pasta à qual a Guarda Municipal é ligada] frisou que antes mesmo desse respaldo legal, proveniente do Congresso Nacional, a Prefeitura já estava trabalhando nessas questões referentes à guarda, como a realização de um novo concurso para aumentar o efetivo da GM, um Plano de Cargos e Salários para esses profissionais, aquisição de novas viaturas e mais armas de choque, além de outras de última geração que serão colocas nas ruas, nos próximos dias. "O concurso, que não pôde acontecer esse ano por falta de orçamento, será realizado no próximo ano, criando mais 120 novos postos para a Guarda Municipal. O prefeito está sensível diante das questões da guarda", e salientou ser um absurdo "a pessoa que lida com aspectos de segurança pública não poder portar arma. Temos que qualificar nossa guarda".
Para o delegado Regional da Polícia Civil, Francisco Gouveia Neto, diante da realidade no Brasil, da necessidade de se andar armado, a guarda deve sim se armar, mas ressalvou destacando que isso após se ter estrutura e treinamento. "Arma sozinha não faz nada, quem é seu responsável é seu portador. A guarda enfrenta hoje a criminalidade como policiais, e é vista por criminosos como se fosse um de nós".
Segundo o comandante da 5ª Região da Polícia Militar, Laércio Reis, o armamento é uma questão de necessidade e legalidade. Para ele, não há como um agente de segurança pública no Brasil trabalhar sem estar devidamente preparado para enfrentar a criminalidade, que, de acordo com o comandante, se torna cada dia mais complexa em volume e intensidade. "A cada dia, mais e mais bandidos atuam em desfavor do cidadão de bem. Nossos novos bandidos são garotos entre 16 e 18 anos. O problema é que, hoje, o cidadão transfere para o Estado aquilo que é de sua responsabilidade e de sua família. Ele põe filho no mundo querendo que o Estado dê fralda, educação, e tudo mais, não querendo cumprir assim a parte dele. Estamos com problemas caindo sobre nosso colo". Laércio enfatizou ainda a falta de interesse do governo federal para as questões de segurança pública no Brasil. "Alguém aqui conhece qual o planejamento do governo para a segurança no país? Ninguém conhece, porque simplesmente ele não existe. Não tem indução de programas voltados para a área de segurança, nem o fortalecimento das Polícias Federal e Rodoviária Federal para assim se evitar a entrada, em nosso município, de armas de fogo, drogas, etc. Essas mazelas todas vêm pra nossa sociedade para acabar com nossas famílias, para aumentar nossa incidência criminal, porque não há fortalecimento do governo para essa questão, e aí a culpada, para não dizer emparedada, é a Polícia Militar e Polícia Civil, que não dão conta". O comandante demonstrou ainda, citando o progresso de Uberaba, preocupação com os problemas que advirão com o crescimento do município. "Temos que nos preparar para esse dia de amanhã e obviamente que aí está incluso a Guarda Municipal, que precisa crescer e estar preparada para desafios".
A vereadora Denise Max (PR) enalteceu as mulheres que trabalham na GM e relatou sua contrariedade em participar de uma audiência cujo objetivo foi se discutir o armamento. "Num mundo onde deveríamos abolir as armas, temos que a cada dia usá-las mais, isso é triste. Espero que o país encontre um governo responsável, que faça políticas para a segurança, e que vocês, guardas municipais, tenham que usar pouco suas armas".
João Gilberto Ripposati, primeiro secretário da Mesa Diretora da Câmara, adiantou que será feito um Fórum Permanente de Segurança Pública, pois, de acordo com ele, o assunto tem quer ser discutido constantemente. "O fórum vai identificar aquilo que já foi cumprido para avançarmos em outras etapas". O parlamentar disse ainda ser lamentável ver jovens portando armas. "Os desafios de segurança vêm avançando e se organizando. Precisamos dar estrutura à GM, não só de armamento, mas também de equipamentos, veículos. O Estado precisa fazer sua parte e o governo federal controlar melhor nossas barreiras para assim se evitar entrada de drogas no nosso país".
Atendendo ao convite de Kaká, esteve presente na audiência o comandante da Guarda Civil de Sertãozinho (SP), Umberto Coelho da Silva. A guarda naquela cidade possui porte de arma de fogo e, segundo Umberto, seu efetivo é formado por 166 guardas civis, sendo 21 mulheres. O setor é equipado com viaturas de pequeno e grande porte, motocicletas, além de equipamentos de uso individual, como coletes à prova de balas, algemas, tonfas, cassetetes, revólveres, pistolas e espingardas. O comandante, que veio relatar brevemente o funcionamento e a estrutura da guarda no município paulista, ressaltou que a "guarda deve sempre prestar um bom trabalho à população, estando armada ou não".
O chefe de Policiamento da Guarda Municipal de Uberaba, Mário Nelson Loreno, destacou que ele e "seus irmãos de farda não se sentem menos policiais por vestirem outra cor de farda. A grande maioria dos guardas dá o sangue todos os dias, mesmo sem o reconhecimento disso pela sociedade", disse. Mário relatou ainda problemas estruturais enfrentados pela corporação da cidade. "Temos uma demanda gigantesca da patrulha do silêncio. Em um final de semana às vezes temos 200 chamados, que são atendidos com uma viatura e dois guardas. Com dificuldades, mas ainda sim atendemos".
Depois de receber o apoio de todas as autoridades de segurança presentes, o comandante da Guarda Municipal de Uberaba, Wesley Marcelo Massako Neto, sugeriu cautela nesse processo. Ele destacou que a GM foi criada inicialmente com o propósito de ser uma corporação uniformizada, cabendo-lhe a fiscalização do trânsito, a proteção e a vigilância dos bens, serviço e instalações municipais e a colaboração na segurança pública. Mas que acabou exercendo funções típicas de polícia. "Quando se fala em armar uma corporação, a solução não é tão romântica e simples, pois é necessário treinamento especializado e contínuo bem como adequações e alterações na forma de trabalho e nas condutas pessoais, profissionais de cada servidor envolvido neste processo. A atual estrutura legal que rege a GM não oferece minimamente condições de fazer com que esta se enquadre na nova realidade, sendo necessária uma mudança profunda em suas Leis e Regulamentos". Marcelo levantou ainda alguns possíveis problemas oriundos desse armamento da GM, como a reprovação de um guarda perante os exames exigidos no processo. "O que será feito com esse guarda reprovado?", indagou. Massako sugeriu que a renovação da guarda seja feita a partir do próximo edital de concurso. "Assim o candidato já estará sabendo dos ônus e bônus antes mesmo de ingressar no Departamento de Segurança". O comandante finalizou dizendo que o "município dentro de uma visão sistêmica de segurança, pode promover diversas ações que diminuirão o impacto nefasto que o crime causa em Uberaba, assim como o combate dos fatores que podem fomentar o delito, entre outros".
Entre os princípios das Guardas Municipais estão a proteção dos direitos humanos fundamentais, do exercício da cidadania e das liberdades públicas; preservação da vida, redução do sofrimento e diminuição da perdas; patrulhamento preventivo; compromisso com a evolução social da comunidade; e o uso progressivo da força.
Estiveram ainda na audiência, compondo a mesa de trabalhos, Maurício Ferreira, representando a Loja Maçônica Sete Colinas; Glaucia Melo, psicóloga credenciada pela Polícia Federal; Vicente Flávio Macedo, presidente da OAB; Elisângela Alves Mariano, da Comissão de Direitos Humanos da Arquidiocese de Uberaba; e Daniel Fabri, representando a CDL. O vereador Kaká Se Liga se comprometeu em agendar uma reunião com o prefeito Paulo Piau para entregar um documento com todas as discussões realizadas durante a audiência e quer, inclusive, a presença de um representante da guarda municipal neste encontro.